Era uma vez, há
muito tempo, um rei e uma rainha jovens, poderosos e ricos, mas pouco felizes,
porque não tinham concretizado maior sonho deles: terem filhos.
— Se pudéssemos ter um filho! — suspirava o rei.
— E se Deus quisesse, que nascesse uma menina! —animava-se a rainha.
— E por que não gêmeos? — acrescentava o rei.
Mas os filhos não chegavam, e o casal real ficava cada vez mais triste. Não se
alegravam nem com os bailes da corte, nem com as caçadas, nem com os gracejos
dos bufões, e em todo o castelo reinava uma grande melancolia.
Mas, numa tarde de verão, a rainha foi banhar-se no riacho que passava no fundo
do parque real. E, de repente, pulou para fora da água uma rãzinha.
— Majestade, não fique triste, o seu desejo se realizará logo: Antes que passe
um ano a senhora dará à luz uma menina.
E a profecia da rã se concretizou, e meses depois a rainha deu a luz a uma
linda menina.
O rei, que estava tão feliz, deu uma grande festa de batizado para a pequena princesa
que se chamava Aurora.
Convidou uma multidão de súditos: parentes, amigos, nobres do reino e, como
convidadas de honra, as treze fadas que viviam nos confins do reino. Mas,
quando os mensageiros iam saindo com os convites, o camareiro-mor correu até o
rei, preocupadíssimo.
— Majestade, as fadas são treze, e nós só temos doze pratos de ouro. O que
faremos? A fada que tiver de comer no prato de prata, como os outros
convidados, poderá se ofender. E uma fada ofendida…
O rei refletiu longamente e decidiu:
— Não convidaremos a décima terceira fada — disse, resoluto. — Talvez nem saiba
que nasceu a nossa filha e que daremos uma festa. Assim, não teremos
complicações.
Partiram somente doze mensageiros, com convites para doze fadas, conforme o rei
resolvera.
No dia da festa, cada uma das fadas chegou perto do berço em que dormia a
princesa Aurora e ofereceu à recém-nascida um presente maravilhoso.
— Será a mais bela moça do reino — disse a primeira fada, debruçando-se sobre o
berço.
— E a de caráter mais justo — acrescentou a segunda.
— Terá riquezas a perder de vista — proclamou a terceira.
— Ninguém terá o coração mais caridoso que o seu — afirmou a quarta.
— A sua inteligência brilhará como um sol — comentou a quinta.
Onze fadas já tinham passado em frente ao berço e dado a pequena princesa um
dom; faltava somente uma (entretida em tirar uma mancha do vestido, no qual um
garçom desajeitado tinha virado uma taça de sorvete) quando chegou a décima
terceira, aquela que não tinha sido convidada por falta de pratos de ouro.
Estava com a expressão muito sombria e ameaçadora, terrivelmente ofendida por
ter sido excluída. Lançou um olhar maldoso para a princesa Aurora, que dormia
tranqüila, e disse: — Aos quinze anos a princesa vai se ferir com o fuso de uma
roca e morrerá.
E foi embora, deixando um silêncio desanimador e os pais desesperados.
Então aproximou-se a décima segunda fada, que devia ainda oferecer seu
presente.
— Não posso cancelar a maldição que agora atingiu a princesa. Tenho poderes só
para modificá-la um pouco. Por isso, Aurora não morrerá; dormirá por cem anos,
até a chegada de um príncipe que a acordará com um beijo.
Passados os primeiros momentos de espanto e temor, o rei, decidiu tomar
providências, mandou queimar todas as rocas do reino. E, daquele dia em diante,
ninguém mais fiava, nem linho, nem algodão, nem lã. Ninguém além da torre do
castelo.
Aurora crescia, e os presentes das fadas, apesar da maldição, estavam dando
resultados. Era bonita, boa, gentil e caridosa, os súditos a adoravam.
No dia em que completou quinze anos, o rei e a rainha estavam ausentes,
ocupados numa partida de caça. Talvez, quem sabe, em todo esse tempo tivessem
até esquecido a profecia da fada malvada.
A princesa Aurora, porém, estava se aborrecendo por estar sozinha e começou a
andar pelas salas do castelo. Chegando perto de um portãozinho de ferro que
dava acesso à parte de cima de uma velha torre, abriu-o, subiu a longa escada e
chegou, enfim, ao quartinho.
Ao lado da janela estava uma velhinha de cabelos brancos, fiando com o fuso uma
meada de linho. A garota olhou, maravilhada. Nunca tinha visto um fuso.
— Bom dia, vovozinha.
— Bom dia a você, linda garota.
— O que está fazendo? Que instrumento é esse?
Sem levantar os olhos do seu trabalho, a velhinha respondeu com ar bonachão:
— Não está vendo? Estou fiando!
A princesa, fascinada, olhava o fuso que girava rapidamente entre os dedos da
velhinha.
— Parece mesmo divertido esse estranho pedaço de madeira que gira assim rápido.
Posso experimentá-lo também? Sem esperar resposta, pegou o fuso. E, naquele
instante, cumpriu-se o feitiço. Aurora furou o dedo e sentiu um grande sono.
Deu tempo apenas para deitar-se na cama que havia no aposento, e seus olhos se
fecharam.
Na mesma hora, aquele sono estranho se difundiu por todo o palácio.
Adormeceram no trono o rei e a rainha, recém-chegados da partida de caça.
Adormeceram os cavalos na estrebaria, as galinhas no galinheiro, os cães no
pátio e os pássaros no telhado.
Adormeceu o cozinheiro que assava a carne e o servente que lavava as louças;
adormeceram os cavaleiros com as espadas na mão e as damas que enrolavam seus
cabelos.
Também o fogo que ardia nos braseiros e nas lareiras parou de queimar, parou
também o vento que assobiava na floresta. Nada e ninguém se mexia no palácio,
mergulhado em profundo silêncio.
Em volta do castelo surgiu rapidamente uma extensa mata. Tão extensa que, após
alguns anos, o castelo ficou oculto.
Nem os muros apareciam, nem a ponte levadiça, nem as torres, nem a bandeira
hasteada que pendia na torre mais alta.
Nas aldeias vizinhas, passava de pai para filho a história da princesa Aurora,
a bela adormecida que descansava, protegida pelo bosque cerrado. A princesa
Aurora, a mais bela, a mais doce das princesas, injustamente castigada por um
destino cruel.
Alguns
cavalheiros, mais audaciosos, tentaram sem êxito chegar ao castelo. A grande
barreira de mato e espinheiros, cerrada e impenetrável, parecia animada por
vontade própria: os galhos avançavam para cima dos coitados que tentavam passar:
seguravam-nos, arranhavam-nos até fazê-los sangrar, e fechavam as mínimas
frestas.
Aqueles que tinham sorte conseguiam escapar, voltando em condições lastimáveis,
machucados e sangrando. Outros, mais teimosos, sacrificavam a própria vida.
Um dia, chegou nas redondezas um jovem príncipe, bonito e corajoso. Soube pelo
bisavô a história da bela adormecida que, desde muitos anos, tantos jovens a
procuravam em vão alcançar.
— Quero tentar também — disse o príncipe aos habitantes de uma aldeia pouco
distante do castelo.
Aconselharam-no a não ir. — Ninguém nunca conseguiu!
— Outros jovens, fortes e corajosos como você, falharam…
— Alguns morreram entre os espinheiros…
— Desista!
Muitos foram, os que tentarem desanimá-lo.
No dia em que o príncipe decidiu satisfazer a sua vontade se completavam
justamente os cem anos da festa do batizado e das predições das fadas. Chegara,
finalmente, o dia em que a bela adormecida poderia despertar.
Quando o príncipe se encaminhou para o castelo viu que, no lugar das árvores e
galhos cheios de espinhos, se estendiam aos milhares, bem espessas, enormes
carreiras de flores perfumadas. E mais, aquela mata de flores cheirosas se
abriu diante dele, como para encorajá-lo a prosseguir; e voltou a se fechar
logo, após sua passagem.
O príncipe chegou em frente ao castelo. A ponte elevadiça estava abaixada e
dois guardas dormiam ao lado do portão, apoiados nas armas. No pátio havia um
grande número de cães, alguns deitados no chão, outros encostados nos cantos;
os cavalos que ocupavam as estrebarias dormiam em pé.
Nas grandes salas do castelo reinava um silêncio tão profundo que o príncipe
ouvia sua própria respiração, um pouco ofegante, ressoando naquela quietude. A
cada passo do príncipe se levantavam nuvens de poeira.
Salões, escadarias, corredores, cozinha… Por toda parte, o mesmo espetáculo:
gente que dormia nas mais estranhas posições.
O príncipe perambulou por longo tempo no castelo. Enfim, achou o portãozinho de
ferro que levava à torre, subiu a escada e chegou ao quartinho em que dormia A
princesa Aurora.
A princesa estava tão bela, com os cabelos soltos, espalhados nos travesseiros,
o rosto rosado e risonho. O príncipe ficou deslumbrado. Logo que se recobrou se
inclinou e deu-lhe um beijo.
Imediatamente, Aurora despertou, olhou par ao príncipe e sorriu.
Todo o reino também despertara naquele instante.
Acordou também o cozinheiro que assava a carne; o servente, bocejando,
continuou lavando as louças, enquanto as damas da corte voltavam a enrolar seus
cabelos.
O fogo das lareiras e dos braseiros subiu alto pelas chaminés, e o vento fazia
murmurar as folhas das árvores. A vida voltara ao normal. Logo, o rei e a
rainha correram à procura da filha e, ao encontrá-la, chorando, agradeceram ao
príncipe por tê-la despertado do longo sono de cem anos.
O príncipe, então, pediu a mão da linda princesa em casamento que, por sua vez,
já estava apaixonada pelo seu valente salvador.
Eles, então, se casaram e viveram felizes para sempre!
Fonte: QDivertido